domingo, 14 de dezembro de 2008

Mais um embuste

A Europa está preocupada. De tal forma que os países da UE resolveram implementar um plano de ajuda à economia europeia, com acções específicas em cada um dos países da união. Desta forma, o Governo Português acabou de anunciar um pacote de medidas de apoio ao emprego, à energia, às empresas, etc., de forma a revitalizar a nossa economia e evitar que a mesma entre em recessão, ou se já entrou, que a ajude a sair da mesma.
Não querendo entrar nos detalhes dos planos que o nosso governo desenvolveu, gostaria de abordar apenas um único aspecto desse plano. O reforço à capacidade de financiamento das PME, com mais um pacote que se vem juntar aos anteriores PME Investe I e II.
É sobre este ponto em particular que merece tecer umas breves considerações.
O programa PME Investe tem como objectivo facultar às empresas, principalmente às PME, financiamento a taxas de juros bonificadas. Para o efeito, o Estado compromete-se a suportar uma parte dos juros a cobrar pela Banca, o que para o primeiro programa PME Investe era de 1,25% e para o segundo de 0,5%, sendo que existe um limite mínimo de 3% que as empresas terão sempre de suportar.
Em meados de 2008, aquando do lançamento do PME Investe I, as taxas de juros praticadas pelos bancos para empréstimos, e em função da Euribor, andavam acima dos 5% ano. Se considerarmos que os mesmos bancos ofereciam na altura juros de mais de 5% aos depósitos a prazo, poderemos, facilmente, compreender que o juro bonificado pelo PME Investe I seria potencialmente inferior ao juro pago pelos bancos nos depósitos a prazo. Aqui estava uma oportunidade de negócio, assim pensaram muitos, que enquanto tivessem o capital do empréstimo na sua conta, à espera de fazer os devidos investimentos, até poderiam obter algum benefício extra com o diferencial dos juros pagos e recebidos.
O programa PME Investe II, que veio reforçar o primeiro, já só ofereceu 0,5%, o que torna esse esquema mais difícil de se obter, até devido ao aumento do valor percentual do spread que os bancos passaram a praticar.
Mas este não é o problema. O problema está no facto que as empresas que viram os seus pedidos de financiamento ao abrigo desses dois programas ainda continuam por “ver a cor ao dinheiro”. Mas desta vez, este atraso da burocracia que caracteriza as acções da nossa administração pública, e ao contrário do que quase sempre acontece, até veio beneficiar as empresas.
Vejamos um pequeno detalhe destas operações. O Estado suporta parte dos juros que os bancos cobram, 1,25 ou 0,5 porcento, no primeiro e no segundo programa respectivamente. Metade do valor do financiamento de cada empresa é garantido à entidade bancária que faz o empréstimo à empresa por um fundo de garantia mútua, retendo-se 1% do valor total do financiamento para depósito nesse mesmo fundo, o que leva a que o banco só assuma metade do risco. Contudo, os bancos exigem em muitos casos que a empresa garanta os outros 50 porcento do financiamento através de garantias reais, entenda-se aplicações a prazo no mesmo banco. Assim, e em contas rápidas de se fazerem, as empresas ficam com 49% do valor do financiamento para utilizar nos seus investimentos.
A acrescentar a esta realidade temos que com a descida constante da taxa de referência do BCE e, consequentemente, da Euribor, também por via das garantias disponibilizadas pelo governo à banca que tem trazido alguma confiança ao mercado financeiro, as empresas acabam por ter de pagar o valor mínimo de taxa de juros estipulado de 3%, o Estado acaba por pagar pouco ou mesmo quase nada e os bancos vêm os seus fundos reforçados, melhorando os seus rácios de solvabilidade. As empresas acabam por pagar todo este exercício de engenharia financeira que, se tivermos em conta a disponibilidade antecipada da informação ou a capacidade de influenciar as tendências da taxa de juros pelos partes que promovem este tipo de acção, assume um carácter maquiavélico que ultrapassa a compreensão da esmagadora maioria das pessoas.
Assim, às empresas que ainda não assinaram contrato nenhum no âmbito dos programas PME Investe, fica um conselho: rejeitem a oferta!
Às que pensarem candidatar-se à nova fase anunciada pelo Governo, façam bens as contas antes de perderem tempo com mais um embuste que nos querem oferecer.
Agora, fica ainda uma pergunta: se as empresas realizarem que não têm vantagens nenhumas com estes programas de ajuda ao investimento e não os utilizarem, para onde vão os vários milhares de milhão de euros anunciados pomposamente como a grande ajuda às PME?

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